Era uma vez um branco que pensava que era preto.
Era uma vez um tipo do século XXI que pensava estar em 1966’s.
Ele é Mayer Hawthorne, inter-ego de Andrew Cohen, um rapaz de Detroit, que se deu a conhecer ao mundo este ano, com o disco A Strange Arrangement.
Mayer Hawthorne aparece neste 2009, com um álbum feito em 2009, e com a mais pura soul dos anos cinquenta ou sessenta.
Pura soul, porque a música que lhe acompanha a voz vem mesmo de lá, desses tempos. O disco quase podia ter sido feito em karaoke, com ele a cantar por cima de temas dos artistas que o inspiraram (Smokey Robinson, Curtis Mayfield, Martha and the Vandellas, Spinners, Supremes, Temptations...), porque o som dos instrumentos tem essa mesma pureza, leveza na forma de bater na tarola e nos pratos da bateria, a pandeireta sempre por trás a acompanhar, os sopros, as teclas, de vez em quando uns sinos. A cadência é a mesma, a sonoridade é a mesma que se fazia nos idos anos em que as fotografias eram a preto e branco.
Depois há a voz dele, frequentemente em falsete, sempre a falar de amores e de garotas, giras ou feias, fugidias ou apaixonadas, que quebram corações ou que os deixam num banco de jardim.
Se eu mostrar isto a alguém e disser que é um tipo qualquer, que nunca foi muito conhecido e só gravou este álbum, em 1963, as pessoas acreditam. Principalmente se mostrar a alguém que já nessa altura ouvisse música.
Isto tudo para dizer que este disco, A Strange Arrangement, é em tudo, semelhante à tal soul, pura, dos anos puros. Quem diz semelhante pode mesmo dizer igual. Só que é tocada em 2009.
E eu ainda estou a descobrir se isso é bom ou é mau.
É bom, por haver um tipo que nos dias musicais que correm faz este tipo de som. Foi beber influências, e está a criar a sua cena. À primeira vista faz lembrar o que se sentiu quando apareceu a Amy Winehouse, com aquele disco Back to Black. A alma também estava lá (não por muito tempo). Mayer Hawthorne tem alma, e acima de tudo, parece-me ter boas intenções. Diz que “não quis criar um disco retro, isto é música nova para uma nova geração”, e quer que “os putos sintam que esta é a música deles e não a música dos pais”.
Mas o problema é que não há grande diferença desta música para a música dos pais dos putos. Pode falar-se em cópia. E não necessariamente “cópia” no mau sentido.
A questão que me coloco é – se não há grande diferença, então de que serve? Por que hei-de ouvir isto em vez dos clássicos dos sessentas?
Hei-de porque tem alguma qualidade, ou não fosse uma cópia de algo que é bom. Se fosse uma cópia da Tonicha, não seria bom de certeza.
E hei-de ouvir porque é feito agora, e é novo, e pode ser que me farte dentro de pouco tempo, mas ao menos por agora é fresco. E tem a vantagem de ser o primeiro disco.
O que vier a seguir, pode ser bem melhor. Também pode ser bem pior. Mas havendo a perspectiva de haver uma continuação é bom. E se isto for o princípio de uma nova era musical? Podia ser. Como os Strokes fizeram nascer, em 2001.
Mesmo que não seja, não faz mal. Ao menos deu para refrescar.
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