Longe vão os tempos em que os Deep Purple eram considerados a “banda mais barulhenta do mundo”! Um título de respeito e que metia medo a temíveis adversários como os Zeppelin ou os Sabbath (sagrada trindade do Hard-Rock). Hoje, passados mais de 40 anos dos míticos “In Rock”; “Machine Head“ ou “Made in Japan”, o grupo transformou-se numa simpática banda de “avozinhos” que tocam por prazer e que não têm ilusões quanto ao conceito de que este: não é definitivamente o seu tempo!
No entanto, isso não quer dizer que não continuem a ser uma grande banda, com um sentido apurado de espectáculo, capaz de atrair (sem qualquer tipo de publicidade ou ajuda dos media) milhares de pessoas que lotaram um Coliseu sedento dos “clássicos” de outrora.
E foi com uma “pontualidade britânica” (21.30), que os cinco veteranos se fizeram ao palco ao som do monstruoso “Highway Star”. A música, que (reza a lenda) foi composta em 1971 num autocarro a caminho de um concerto em Plymouth, cheio de jornalistas, que lhes perguntaram: “como é que vocês compõem uma canção?” Os Purple fizeram-lhes a vontade. Inventaram o tema na hora e estrearam-na no palco nessa mesma noite. Outros tempos…
De volta ao Coliseu, lá estavam eles. O baterista Ian Paice, sólido que nem pedra a imprimir o ritmo. O baixista Roger Glover, sempre com o seu ar Hippie e descontraído. O vocalista. Ian Gillan, envergando uns óculos escuros, cabelo curto e ar de turista inglês a passear em Albufeira. O “novo” recruta, Don Airey (que substituiu Jon Lord em 2002) e finalmente…o director musical, um dos melhores guitarristas do mundo, o homem que conduz com os pés só para poder tocar ainda mais velozmente, o rei da festa: Steve Morse!
Se Ritchie Blackmore já saiu há 17 anos e ninguém pede o bilhete de volta…alguma coisa se passa de “bem” no reino dos Purple! E lá está Morse a solar…ainda melhor que o próprio Blackmore em “Highway Star”.
Destaque também para voz de Gillan, que apesar de já não conseguir atingir muitas das oitavas (vulgo: agudos) que eram a sua trademark esteve sempre em boa forma. Depois “a marinha” seguiu ao som de “Things I Never Said”, uma faixa da edição especial de “Rapture of the Deep”, o último de estúdio (já lá vão 5 anos) e que a par com o tema homónimo desse disco foram os únicos toques de “modernidade” a navegar num “mar de clássicos”.
E lá apareceu o gigante “Strange Kind of Woman” (onde faltou apenas o duelo de “voz/guitarra” imortalizado em “Made in Japan”); o bluesy “Maybe I´m a Leo” (uma das surpresas da noite) e o rápido “Fireball”. Os Purple carregavam no acelerador e não deixavam “prisioneiros para trás”.
Depois lá apareceu o solo de Steve Morse (com numa peça comovente chamada “Contact Lost”: dedicada aos astronautas falecidos no último acidente espacial da nave Challenger em 2002) que antecedeu a entrada da balada “When a Blindman Cries”. Houve quem ainda gritasse por “Child in Time”, mas ainda não foi desta (nem nunca será) que Portugal foi brindado com o épico vocal de Gillan.
A partir daqui foi sempre a subir. Ainda tiveram tempo para sacar do baú, “Mary Long” de “Who Do We Think We Are” e “No One Came” (de “Fireball”). Depois foi um festim de memórias com os habituais “Lazy”, Space Truckin”e a música mais aguardada da noite, o riff que qualquer aspirante a tocar guitarra quer aprender, o imortal: “Smoke on the Water” (com direito a coros bem altos da multidão)!
Houve ainda pelo meio um solo de teclas de Don Airey, que simpaticamente conquistou os portugueses ao tocar o tradicional “Cheira bem, Cheira Lisboa”, antes de introduzir “Perfect Strangers”, a única canção dos anos 80 que os Purple ainda não se envergonham de tocar.
Cumpridas as expectativas, chegou a altura dos encores. Primeiro com “Speed King”, onde Airey e Morse protagonizaram uma troca impressionante de solos e Gilan aproveitou para cantar pelo meio algumas canções de Elvis e Ray Charles. Depois com”Hush”, o primeiro êxito dos Deep Purple, já lá vão 42 anos. E a finalizar (com mais um brilhante coro da assistência), “Black Night”, escrita há quatro décadas atrás depois de uma noite de bebedeira em que a editora (EMI) depois de escutar os resultados das sessões de “In Rock”lhes perguntou: “onde está o single?” Outros tempos…
Os Purple são definitivamente doutra era. Mas, a vontade e a “arte de saber bem tocar” continuam lá e sobrepõem-se a qualquer preconceito que possamos ter pelo facto de estes senhores terem idade para serem nossos “avós”. Tomara a muitas bandas novas chegar a uma alquimia deste calibre. Razão mais que suficiente para os reverenciarmos como uma das bandas míticas, ainda em actividade, com vontade de ir até onde as forças permitirem.
Ou como disse Gillan numa entrevista há uns anos quando lhe perguntavam se considerava os Deep Purple uma banda de “Rock Clássico: “Claro que não! A diferença entre nós e as bandas da nossa altura é que a nossa história ainda está longe de estar concluída!”
(8/10)
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